O mandatário de Gouveia e Melo insiste, por outro lado, que o candidato à Presidência não demitiria um Governo por incumprimento de promessas eleitorais, perante uma situação "absolutamente extraordinária". Rio não falou do assunto com o almirante, mas acredita que "essa afirmação tem o seu quê de pedagógico", mostrando que não lhe agrada, como a todos nós, que os partidos façam promessas que depois não cumprem".
Nesta entrevista à Renascença, Rio diz que o candidato presidencial está em sintonia consigo relativamente à necessidade de uma reforma da justiça: "Acho que caso Gouveia Melo seja Presidente, a probabilidade de tal acontecer é um pouco maior. Já sei que vou ouvir comentadores a dizerem: 'ele fala como se o Presidente fosse executar, quer transformar isto num regime presidencialista'. Ninguém quer transformar em nada. Nós sabemos todos que o Presidente não governa e não vai para lá governar. Agora sabemos uma coisa, que tem um poder de influência grande, e é para isso que o cargo existe".
Por fim, Rui Rio admite que a sua posição e a de Gouveia e Melo são diferentes sobre a Eutanásia, mas não atribui à divergência particular significado: "O Presidente, neste dossier, é pouco mais que simbólico".
Vai ser o mandatário nacional da candidatura presidencial de Gouveia e Melo. Pode dizer-se que é um regresso à vida política?
É, efetivamente, um regresso à política até janeiro, isso é evidente, porque não vou dizer que aceito ser mandatário e depois não faço mais nada, fiz um discurso e acabou. Não, com certeza estou disponível para ajudar e, portanto, até janeiro, que são as eleições presidenciais, seguramente. Depois disso não. A minha vontade não é regressar aos principais palcos da política. Posso ter uma intervenção diminuta numa coisita qualquer.
Admite, por exemplo, que possa vir a ser conselheiro de Estado, no caso de Gouveia Melo ser eleito?
Sim. Não é uma coisa muito grande, mas não é uma coisa que me motive. Já lá estive, já fui conselheiro de Estado, não é assim uma coisa que me motive muito.
E à política ativa, quer no PSD, quer, imaginemos…e eu já tenho idade para me recordar do PRD, algo ao estilo do PRD poderia voltar, e apoiar algum partido que formasse um pouco na vaga de Gouveia Melo?
Não, acho que seria muito negativo se um candidato a Presidente da República, seja o almirante Gouveia Melo, seja outro qualquer, não recusasse terminantemente a lógica de que vai para Belém e, se puder, faz um partido. Isso não. Eu sou totalmente contra isso e acho que, dos candidatos que se perfilam, acho que todos têm a consciência de que, a partir da Presidência da República não se vai fazer partido político nenhum. O Presidente da República é um árbitro da vida nacional, portanto, é esse o papel que tem de ter, não é um interventor a tentar fazer um partido como foi feito no passado com o PRD, não.
Acha que isso não vai acontecer…
Acho que não vai acontecer, claro, e sou totalmente contra isso. Seria desvirtuar a função do Presidente da República.
O facto de Gouveia Melo não ser um político - e acusam-no disso - é um handicap, neste momento, ou pode ser considerada uma virtude?
Eu acho que é uma virtude, sinceramente. Acho que é uma virtude, porque as pessoas estão cansadas de quem vive em torno da política, só em torno da política, da pequena tática, da pequenina coisa, do alimentar de ódios, e não gostam deste, e têm agendas, e as pessoas percebem que não estão com frontalidade, percebem que não estão a falar com sinceridade, as pessoas estão fartas disso. E o que nós hoje mais temos na política, e encaixa aqui a política partidária, mas encaixam muito, muito, muito os comentadores, designadamente nas televisões. As pessoas estão cansadas disso. O comentador vai a abrir a boca, e já se sabe, é sempre contra aquele e a favor do outro. E se tiver de mentir, mente, para defender a sua posição. Isto tudo está desgastado, e eu estou farto, eu estou farto, palavra de honra. E sinto que as pessoas também estão fartas disso. Falta sinceridade, falta rasgo, falta coragem, e, portanto, quando alguém vem completamente de fora deste mundo, é algo que eu considero positivo. Se me vierem dizer: “estás com essa conversa, mas tu próprio és desse mundo” …não, desculpe, eu não sou desse mundo. Andei muitos anos na política, é verdade, mas não sou desse mundo.
"Dos candidatos que se perfilam, acho que todos têm a consciência de que, a partir da Presidência da República, não se vai fazer partido político nenhum"
Mas não é perigosa para a democracia a decrescente importância dos partidos políticos?
Os partidos políticos não caíram em termos de importância, eles são muito importantes, porque são eles que estão na Assembleia da República, e é partido da Assembleia da República que se governa o país. O Governo sai da Assembleia. A importância mantém-se a mesma, agora, eles estão é muito descredibilizados e têm menos poder. Quando eu digo menos poder, não é menos poder do ponto de vista constitucional ou do ponto de vista legal, é menos poder no sentido político. Como estão descredibilizados, têm menos força na sociedade para fazer aquilo que se impõe que deve ser feito, a começar por reformar aquilo que tem de ser alterado estruturalmente, e que por não se alterar, vai definhando, degradando a vida das pessoas, e vai aparecendo a desilusão por aí.
É por aí que eu pergunto se não vai surgir algum partido ao estilo PRD.
Pode surgir um outro partido, não ao estilo PRD. Ou seja, não a partir da Presidência da República. Agora, com dinâmicas sociais, bom, já apareceu a IL (Iniciativa Liberal), já apareceu o LIVRE, e já apareceu o Chega. Não tem nada a ver com a Presidência da República. Portanto, da livre iniciativa dos cidadãos, pode, claro que pode. Se os partidos estão tão descredibilizados, pode. Não a partir da Presidência. Volto a repetir, isso seria desvirtuar completamente o papel do Presidente da República no quadro constitucional português.
O senhor, enquanto mandatário nacional, será uma espécie de braço político do Gouveia e Melo, de conselheiro político, a voz da experiência política que falta ainda ao candidato?
Eu estou disponível para ajudar naquilo que o almirante Gouveia e Melo entenda como necessário e entenda que eu possa constituir uma mais-valia. Como sabe, o cargo de mandatário nacional pode ser exercido de muitas maneiras, não é? Pode ser alguém que apareça de quando em vez a fazer um discurso, ou apareça só ao lado do candidato… ou pode ter um papel mais interventivo na organização da campanha, do programa…
O senhor vai ser mais interventivo?
Estou disponível para as duas situações. Ou seja, serei aquilo que o candidato entender como mais útil para ele. Eu estou aqui para ajudar Gouveia e Melo a ser o Presidente da República.
Desde logo, trazendo alguns elementos fortes do PSD, por exemplo, para esta candidatura?
O facto de eu estar na candidatura com a visibilidade decorrente de ser mandatário nacional pode facilitar muito virem pessoas, seja do PSD, sejam independentes, eventualmente até do PS, não sei. Pode facilitar um bocado a adesão de algumas pessoas à candidatura. Acredito que muitas pessoas, que se revêm em mim, possam aderir mais facilmente à candidatura do que se eu não estivesse. Acredito que isso seja possível, até medindo por muitas e muitas mensagens que fui recebendo, que recebi particularmente no sábado à noite, e no domingo. Ainda hoje recebo uma ou outra.
Mas vai ser ativo nessa conquista, nessa pesca?
Bem, se as pessoas me mandam mensagens a dizer que estão disponíveis…alguns dão os parabéns e ficam muito contentes, outros estão disponíveis e até pedem para colaborar. Se eu tiver um papel mais dinâmico na candidatura, com certeza que vou aproveitar isso. Quer dizer, se as pessoas estão a pedir…
Pode dizer-nos algum nome sonante que esteja para aparecer?
Não. Não posso, até porque se eu lhe disse que ainda não está completamente definido, na estrutura global, o papel do mandatário nacional. Também não andei a fazer contactos sem que essas coisas estejam definidas, como é lógico.
Noutro plano, Gouveia e Melo admitiu que no lugar de Marcelo Rebelo de Sousa teria dado posse a um Governo liderado por Mário Centeno, quando Costa se demitiu…dado que existia - sublinhou o almirante - uma maioria absoluta no Parlamento. Concorda?
Concordo. A responsabilidade da demissão do Dr. António Costa é integralmente do Ministério Público. Não é dele, é do Ministério Público. Eu acho que naquelas circunstâncias, naquela altura, era impossível o Dr. António Costa continuar como Primeiro-Ministro, fazendo conta que nada tinha acontecido. A dissolução do Parlamento não é culpa do Ministério Público, é culpa do Presidente da República, é uma opção do Presidente da República. Portanto, eu concordo. Acho que o Presidente da República deveria ter aceitado a demissão de António Costa, tal como aceitou, e depois deveria aceitar aquilo que fosse a proposta do Partido Socialista para continuar a governar e para haver um quadro de estabilidade. Não serve qualquer nome indicado pelo PS, como é evidente. O Presidente da República também tem de reconhecer no nome indicado competência para o efeito. E, portanto, se por acaso fosse Mário Centeno e por qualquer motivo o Presidente da República entendesse que Mário Centeno não era a figura ideal, teria de conversar com o PS para arranjar, eventualmente, uma outra figura.
Portanto, em sua opinião Marcelo Rebelo de Sousa fez mal em antecipar as eleições?
Acho que sim. Se agora fizermos um balanço global, teve de dissolver nos Açores, dissolveu duas vezes na Madeira, dissolveu duas vezes o Parlamento português…duas ou três vezes, até perdi a conta. Portanto, eu acho que isso é a criação de permanente instabilidade e acho que o Presidente da República tem como função procurar também a estabilidade. Não pode deixar as coisas apodrecerem em nome da estabilidade, mas deve lutar o mais possível pela estabilidade, porque é até, como se diz, o garante do regular funcionamento das instituições e disso faz parte, também, não andar permanentemente a dissolver e a criar instabilidade.
"A dissolução do Parlamento não é culpa do Ministério Público, é culpa do Presidente da República, é uma opção do Presidente da República"
Mas esta posição assumida, tão cedo, pelo Almirante Gouveia Melo pode abrir portas a uma solução semelhante num futuro próximo, caso venha a existir algum facto que coloque verdadeiramente em causa, no plano ético e político, o mandato de Luís Montenegro?
Eu ouvi o Almirante Gouveia Melo a responder a essa pergunta e ouvi já, entretanto, alguma maldade na forma de interpretar a resposta que ele deu. Ele deu uma resposta de La Palice. 2+2= 4. O que ele diz é: no quadro que está, está…e, obviamente, é para cumprir. Não há dissolução nenhuma da Assembleia da República, como é evidente.
Ou seja, se porventura surgissem notícias que colocassem em causa ética, ou politicamente, o atual primeiro-ministro…em vez de largar a bomba atómica, provavelmente o almirante tentaria encontrar soluções dentro da própria Assembleia da República?
Vamos lá ver, estando como está, o problema não existe…já foi ultrapassado. Se, no quadro deste problema - que está politicamente arquivado - for desenterrada qualquer coisa de relevante, ou de outro caso qualquer, obviamente que tem de ser analisado. Qual era a resposta ao contrário? “Aconteça o que acontecer, não analiso nada” …isso não faz sentido nenhum. Portanto, tem de haver no espaço público, principalmente no comentário, um mínimo de racionalidade e um mínimo de bom senso, não é? Senão isto é um disparate, como tem sido um disparate de pegado. A pessoa dá qualquer resposta, uma resposta quase de La Palice, e tentam deturpar e dizer “hei, propõe-se já a dissolver”. Não se propõe a dissolver nada.
Ele poderia dizer, “aconteça o que acontecer, não dissolvo”? Pelo amor de Deus, haja um pouco de equilíbrio e de bom senso, não é?
Mas é também neste ponto das possíveis dissoluções, que Marcelo Rebelo de Sousa foi recordista…será esta, também, uma das marcas de diferença que Gouveia e Melo vai ter em relação ao atual Presidente, é isso? Além do uso parcimonioso da palavra? A estabilidade passa também, no caso de uma crise que surja no Governo de Montenegro, por tentar encontrar outras soluções, em vez de convocar eleições?
Eu acho que a obrigação do Presidente da República é, realmente, procurar sempre outras soluções, evitando a “bomba atómica”. A chamada “bomba atómica” é a dissolução do Parlamento. Às vezes é possível, outras vezes é impossível. Eu acho que a conduta de um Presidente da República deve ser essa. No limite pode ter de ser dissolvido, mas eu acho que não pode ser da forma como foi nos últimos anos.
Questão que levantou polêmica nas palavras de Gouveia Melo, desde logo no artigo que escreveu no Expresso, e que agora o candidato tenta explicar um pouco melhor, foi aquela do cumprimento do contrato entre a população e o Governo. Diz Gouveia Melo que esse pode ser um motivo, justamente, para poder dissolver o Parlamento ou demitir o Governo…caso exista uma gravíssima falta de cumprimento do programa eleitoral. Isso não cria um pouco de incerteza?
Bom, ele na entrevista que concedeu à TVI já clarificou isso em larga medida, explicando que se referia a um evento absolutamente extraordinário.
E estará a pensar em quê? Com certeza já falou sobre isso com o Gouveia Melo.
Não, não falei, não sei. Em abstrato é uma coisa absolutamente extraordinária. Mas eu penso que essa afirmação tem também o seu quê de pedagógico, não é? Se há coisa que nós hoje criticamos na política, é o facto de nos prometerem tudo e mais alguma coisa, e depois não cumprirem. Eu direi até - mas isto só me responsabiliza a mim - que às vezes ainda é pior cumprir do que não cumprir, porque tendem a prometer o possível e o impossível, para ganharem as eleições e depois, com medo de que digam “este aldrabão não cumpre”, tentam aplicar o que, na prática, é impossível e a situação ainda é pior. O que é que eu quero dizer com isto? Nessas palavras também vejo uma tónica pedagógica, mostrando que não lhe agrada, como a todos nós, que os partidos façam promessas que depois não cumprem. Mas, na verdade, se fôssemos a dissolver o Parlamento por essa razão, estaríamos a dissolvê-lo de três em três meses porque, efetivamente, isso acontece com muita frequência.
Aliás, o próprio almirante Gouveia e Melo dizia, não há muito tempo, que não iria ser candidato, e que “quando diz não é não”. Na verdade, acabou por ser candidato. As coisas mudam…
Sim, as coisas mudam. E no caso dele nem mudam assim tanto. Vamos lá a ver uma coisa: Quando alguém é militar de carreira e vê-se, de repente, numa situação como a dele…não é comum haver um militar de carreira no exercício da sua função e, de repente, começar a ser convidado, pressionado, para se candidatar a Presidente da República. Isto é muito incomum. E, portanto, o que é que pode responder alguém que é militar a 100% e no exercício de uma função em que se tem de afastar totalmente da política? É obrigado a dizer que recusa ir para a política. Tem mesmo de estancar isso, sob pena de não conseguir cumprir em condições a função superior, militar, de que está investido. Há situações destas, não é? Uma vez que sai da vida militar, tem a liberdade que temos todos nós. Ali não tinha. Isto tem de ser compreendido, não é? Isto tem de ser compreendido. É muito diferente do que eu ir para uma campanha eleitoral “prometer mundos e fundos” e depois não cumprir. São coisas diferentes.
Um tema em que julgo que não estará totalmente em concordância com Gouveia Melo é o de eutanásia. O almirante disse que era um defensor da vida e que não concordava com a eutanásia. Só a aceitaria “em casos extremos”, estou a citar de cor. Nisso parece-me que não está de acordo com o Gouveia Melo…
A minha posição relativamente à eutanásia é conhecida. Eu participei, desde o início, no movimento que nasceu - já nem me lembro se foi em 2015 ou 2016 - ainda com o Dr. João Semedo…que, entretanto, faleceu. Portanto, as pessoas sabem qual é a minha posição. Percebi, pela resposta dada pelo almirante Gouveia Melo que, não fechando a porta completamente - porque disse que compreende que há situações em que é uma própria tortura humana - pelo que preferiu, mostrou que não defende da mesma maneira que eu defendo, seguramente. Agora, deixe-me dizer, acho que o papel do Presidente da República num dossier destes é relativamente de pouca importância. E é isso que as pessoas têm de perceber. A lei de eutanásia é feita no Parlamento e, como todas as leis, se houver dúvidas de constitucionalidade, tem de ir ao Tribunal Constitucional. Depois de passar no Tribunal Constitucional, vai ao Presidente da República, como todas as leis, para promulgar. E o Presidente ou promulga ou não promulga. Sendo que, se não promulgar, é apenas um ato simbólico, porque devolve à Assembleia da República, que reconfirma, se quiser reconfirmar, e ele é obrigado a promulgar.
O Presidente, neste dossier, é pouco mais que simbólico. Onde as questões se jogam é no Parlamento. Portanto, há uma lei, neste momento, aprovada no Parlamento. O Presidente da República não tem nada a fazer. É aprovada no Parlamento. Foi ao Tribunal Constitucional que sugeriu…acho que duas alterações, já não sei. O Presidente da República não vai fazer nada. O Parlamento faz ou não faz; o Governo não regulamenta ou não regulamenta. Portanto, isto está nessa esfera. Quando chegar ao Presidente, o Presidente só tem de fazer isso. Quer dizer, se já passou o crivo Constitucional, promulga ou não. Sendo que, mesmo que não promulgue, se o Parlamento devolver, tem de promulgar obrigatoriamente. Portanto, para as eleições presidenciais a eutanásia não tem relevo. Não tem. Não é aí que as coisas se jogam.
Já falou com o almirante Gouveia e Melo sobre a necessidade de uma reforma da Justiça?
Sim, sim. Isso é algo em que há sintonia. E a sintonia que existe, num dossier muito importante, é nós temos de salvar o Estado de Direito Democrático. E um dos pilares fundamentais do Estado de Direito Democrático é, obviamente, a Justiça. E quanto à Justiça, em Portugal, há uma consciência clara de que não tem estado capaz de responder ao país nos termos que se exige. Não está capaz. Está bastante incapaz, pelas mais diversas razões. E, portanto, é uma leitura que nós dois comungamos. Mas eu estou convencido de que hoje agora somos, acho, 11 milhões (de portugueses) ...e que em 11 milhões há 10 milhões também que comungam.
"O papel do Presidente da República num dossier destes (eutanásia) é relativamente de pouca importância. E é isso que as pessoas têm de perceber"
Acha que é desta (que se faz a reforma da justiça)? Caso o Gouveia e Melo seja eleito Presidente?
Não. Acho que caso Gouveia Melo seja Presidente, a probabilidade de tal acontecer é um pouco maior. Mas temos de estar sempre a dizer a mesma coisa. Já sei que vou ouvir comentadores a dizerem: “ele fala como se o Presidente fosse executar, quer transformar isto num regime presidencialista”. Ninguém quer transformar em nada. Nós sabemos todos que o Presidente não governa e não vai para lá governar. Agora sabemos uma coisa, que tem um poder de influência grande, e é para isso que o cargo existe. É a tal magistratura de influência. Se nós tivermos um Presidente da República que está convicto de que tem de haver uma reforma profunda na justiça portuguesa, é alguém que vai procurar influenciar no sentido de o Parlamento a fazer. Se tivermos alguém que não está convencido disso ou que estando convencido disso não tem coragem nenhuma, para não afrontar interesses, isso não vai acontecer.
Marcelo Rebelo de Sousa não estava convencido disso?
Eu, quando era líder de oposição, fiz um esforço enorme com todos os outros líderes políticos da altura, que tinham grupos parlamentares, ainda o Chega não existia no Parlamento. Fiz um esforço grande…e também com o Presidente da República, isto em 2018, e o esforço deu em zero, porque os partidos não quiseram ou porque tiveram receio, não tiveram coragem, e o Presidente também não quis. Podia ter aproveitado. O líder de oposição e o Presidente, se ambos quisessem, já era um condicionamento muito grande para o primeiro-ministro…que também não percebi porque é que não quis, o Dr. António Costa. Portanto, o papel do Presidente da República numa coisa destas é relevante. Agora, não é ele que vai fazer. Mesmo assim, e apesar de eu estar a dizer isto, vai haver muito comentador a dizer “ele pensa que o Presidente é que vai fazer”. Mesmo que a gente matraqueie duas, três vezes, nem todos tem capacidade, e vontade às vezes, para ouvir o que se está a dizer.