A história do Teatro José Lúcio da Silva, construído em Leiria há 59 anos, é contada num novo livro publicado no sábado, fruto de um estudo que traça o importante papel desempenhado pelos doadores que o pagaram.
O teatro comemora esta semana aniversário com o programa “Teatro José Lúcio da Silva – Contributos para a sua História (1951-1967)”, resultado de seis anos de pesquisa de Adélio Amaro.
Os investigadores começaram em 1951 porque “foi aí que começaram as discussões sobre a demolição do Teatro D. Maria Pia”, que tinha sido o teatro de Leiria e foi destruído em 1958.
Lembrou à agência Lusa que na altura “o objetivo era construir um teatro mais moderno no mesmo local, mas isso acabou por não ser possível devido a uma série de discussões”.
Outros locais foram mencionados, mas o assunto tornou-se polémico «até que finalmente apareceu José Lúcio da Silva e disse que oferecia cinco mil dólares para a construção do novo teatro, mas que teria de coordenar todo o processo».
A proposta foi anunciada em manchete no extinto diário Volvos em 21 de outubro de 1963, que informava que "um doador anônimo" poderia financiar a construção.
Adelio Amaro disse: “Na medida em que o jornal El Popular coordenou a campanha, o presidente da Câmara (de Leiria) e o governador civil (de Leiria) foram imediatamente a Lisboa para saber quem”.
Em Leiria, mas também em todo o país, a notícia teve grande impacto. “Vários jornais nacionais falavam sobre isso.” O autor lembra que houve uma surpresa geral: “Como alguém pode gastar cinco mil dólares para construir um teatro e então alguém fez essa pergunta?”
Cedo deixou de ser um mistério: tratava-se de José Lúcio da Silva (1902-1972), um leiriense que trabalhou como banqueiro e pequeno empresário e fez fortuna na indústria da borracha em Lisboa.
“É muito respeitado em Lisboa – faz até parte do grupo social do Sporting CP – mas quase ninguém o conhece em Leiria”.
Mas isso mudou imediatamente, pois a proposta de José Lúcio da Silva era irrefutável – “desarmou todo mundo” – e fez dele uma figura pública.
O doador, que já não é anónimo, expôs as condições da oferta: “deve ser ele quem coordena o projecto” e “a câmara de comércio deve ser quem organiza o espaço”, além de “uma pequena casa" para ele e seus. É sempre assim para os familiares.”
No que era então uma vinha, o município obteve dos proprietários a cedência do espaço necessário, permitindo a urbanização do restante espaço. O resultado foi a transformação de Leiria na actual Avenida dos Heróis de Angola, uma das avenidas mais importantes da cidade, definida pela instalação do Teatro José Lúcio da Silva.
“Os herdeiros da família Marques da Cruz cederam gratuitamente o espaço para a construção do Teatro José Lúcio da Silva, e a partir daí ocorreu um processo de construção muito rápido – em pouco mais de dois anos – —e inaugurado em 15 de janeiro , 1966."
José Lúcio da Silva fez mais do que cumprir sua promessa. Além dos cinco mil dólares “o equivalente hoje a três a quatro milhões de euros”, o empresário assumiu ainda o preço total da obra, que foi “o dobro do valor”.
Entre outras coisas, assumiu a direção logo no primeiro ano, negociou contratos diretamente e trouxe para Leiria “todos os melhores filmes do mundo e as grandes peças das companhias lisboetas, com grande sucesso, pois quase todos os espetáculos estavam esgotados”. " Neste palco já actuaram Amélia Rey Colaço, Raul Solnado, António Silva, Eunice Muñoz, Maria Barroso e outras companhias.
O Teatro José Lúcio da Silva preencheu uma lacuna cultural em Leiria e provocou outras mudanças.
“A partir desse momento, a cidade começou a adquirir outra dimensão, que continua até hoje. As pessoas começaram a pensar: se fosse possível construir um novo teatro e alguém pagasse por ele, então seria possível fazer muito mais”, conclui Estrada Adrio para Amaro.