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Lamentamos profundamente transmitir à comunidade abóbora O sigilo fiscal brasileiro morre em Portugal aos 36 anos. Com o nascimento da Constituição de 1988, ele nos deixou prematuramente em 31 de dezembro de 2024, sendo vítima de uma dose fatal de 5 mil reais – número que se tornará sua lápide na história da tributação nacional.
Sigilo Fiscal foi o filho mais querido da democracia e do Estado de direito, e a sua vida foi cheia de aventuras e infortúnios. Durante a sua existência, protegeu milhões de brasileiros dos olhares indiscretos do Estado, garantindo que as transações financeiras permanecessem privadas — ou quase isso.
Isso deixa os órfãos que se movimentam por mais de R$ 5 mil por mês agora expostos aos holofotes da Receita Federal sem qualquer motivo razoável. Por outro lado, os seus primos mais pobres, com valores mais baixos, herdarão uma estranha bênção: a invisibilidade financeira. Os velórios foram realizados em agências bancárias e aplicativos de todo o Brasil, onde “mais de 5 mil” cidadãos puderam dar um último adeus à sua privacidade financeira. Os “menos de cinco mil” estão isentos das formalidades – afinal, são praticamente invisíveis ao governo e até isentos do pagamento de imposto de renda.
Em vida, Sigilo ficou conhecido pelo seu caráter complexo e burocrático, traços herdados de uma família tradicional, ou seja, uma família de direitos fundamentais. Mas sua adoção marcou o nascimento de uma nova era da sociomatemática brasileira, em que a cidadania fiscal tem um preço fixo: cinco dólares. Em Portugal continuamos com declarações centenárias de IRS, enquanto o Brasil inova ao criar uma espécie de purgatório fiscal: nem céu nem inferno, apenas um inferno para milhões de cidadãos.
O mais irônico desse funeral é que também criou uma nova categoria social para o país. Não se trata mais de uma nota A, B ou C, mas de uma simples divisão: o que é visível e invisível aos olhos do leão. É como se o governo tivesse descoberto uma nova forma de estratificação social, onde 4.999 reais fazem de você um fantasma, mas 5.000 reais fazem de você uma estrela fiscal.
No seu último suspiro, o Sigilo Fiscal ainda tenta defender a privacidade e os direitos individuais, mas é derrotado pela simplicidade sedutora do número mágico. Afinal, quem precisa de complexidade quando você pode resolver todos os seus problemas com um único valor?
Aqueles que permanecem permanecem nostálgicos de uma época em que a privacidade financeira não tinha preço. Saudamos esta nova forma de cidadania monetizada, onde aceitar ou não aceitar (verificar) é apenas uma questão de alguns dólares.
Em homenagem ao falecido, o governo recomenda que os cidadãos preocupados com sua privacidade financeira aceitem transações inferiores a 5 mil reais. Como disse um astuto economista presente na cerimônia fúnebre: “O Brasil nunca foi tão criativo em transformar a pobreza em benefícios fiscais”.
O sigilo fiscal do Brasil deixa para trás um caso especial: a invisibilidade social agora tem um valor de mercado. Que descanse em paz enquanto continuamos a assistir com confusão e fascínio este capítulo da sempre surpreendente criatividade do Tupiniquim em remodelar conceitos universais. Como se costuma dizer, no Brasil até o passado é incerto.